No Brasil, o meio ambiente é tutelado por diversos atos normativos, e estes possuem o seu fundamento com a validade do texto constitucional, vez que a Constituição Federal, ao dispor acerca da proteção ao meio ambiente, indica, conforme do art. 225, §3º, que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

A disposição constitucional se refere a chamada Tríplice Responsabilidade Ambiental, e isso implica dizer que o poluidor/infrator poderá ser responsabilizado ao mesmo tempo nas esferas civil, administrativa e penal, de forma independente e autônoma, pelo mesmo fato, sem que seja considerado bis in idem ou abuso de sanções.

Conforme mencionado inicialmente, os atos normativos que tutelam o meio ambiente se especificam em várias esferas, e, entre outros, a responsabilidade civil por danos ambientais se encontra prevista no art. 4º, VII, da Lei n. 6.938/1981.

De forma geral, a responsabilidade civil ambiental é apurada através da abertura de um inquérito civil pelo Ministério Público Estadual ou Federal, e caso constatada a responsabilidade do poluidor/infrator, é ajuizada uma ação judicial visando exigir a recuperação do meio ambiente e indenização pecuniária pelo dano causado.

As ações dessa natureza também são fundamentadas sob a égide da Súmula 629/STJ: “Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar”.

Neste ponto, também é preciso ressaltar que, para que ocorra a procedência de uma Ação Civil Pública Ambiental, com a responsabilização do proprietário ou daquele que detenha a posse do imóvel, deve haver a comprovação da ocorrência do dano e o nexo causal com a conduta investigada.

Ocorre que, mesmo diante de tantas previsões legais a respeito da temática, ainda perdura no país uma grande insegurança jurídica e divergência de entendimentos legais.

O tema foi objeto de discussão em Ação Civil Pública Ambiental ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso em face de um proprietário de imóvel rural, por desmatar cerca de 15,467 hectares de floresta nativa na região amazônica, com exploração de madeireira e abertura de ramais, sem autorização ou licença do órgão ambiental responsável.[1]

O Juízo de 1º Grau julgou parcialmente procedentes os pedidos da Ação Civil Pública, para condenar o requerido a recompor o meio degradado, obrigando-se a não desmatar, bem como ao pagamento de indenização pelos danos materiais decorrentes do impedimento da recomposição natural da área. Entretanto, a sentença desproveu o pedido de indenização por danos morais coletivos, sob o fundamento de que o reconhecimento do dano moral exige a comprovação de que o ilícito tenha causado intranquilidade social ou alterações relevantes à coletividade local.

O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, insatisfeito com as condenações já impostas, interpôs recurso ao Superior Tribunal de Justiça – STJ, recebendo o provimento da Segunda Turma, o qual condenou o proprietário do imóvel rural também ao pagamento de indenização por dano moral coletivo.

De acordo com o STJ, uma vez constatado o dano ambiental, que não se confunde com o mero impacto negativo decorrente de atividade regular, incide a Súmula 629/STJ, que admite a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar. Além disso, o entendimento que vem prevalecendo no Tribunal Superior é de que o dano moral in re ipsa[2] dispensa a demonstração de prejuízos concretos e subjetivos, surgindo diretamente da ofensa ao direito ao meio ambiente equilibrado.

A decisão do STJ poderá impactar milhares de proprietários rurais, réus em Ações Civis Públicas Ambientais por desmatamento sem autorização legal, cujo precedente deve ser utilizado com cautela pelos Magistrados no julgamento das ações em trâmite.

Isto porque devem ser observadas as peculiaridades de cada caso, levando em consideração a existência de dano ambiental a partir da conduta infracional, pois, como traz a decisão do STJ em comento, não se pode confundir dano ambiental com o mero impacto negativo decorrente da atividade.

Há, ainda, inúmeras ações ajuizadas pelo Ministério Público visando responsabilizar civilmente o proprietário rural que promoveu o desmate de áreas passíveis de supressão, ou seja, áreas que podem ser desmatadas no imóvel rural, respeitando o percentual previsto no Código Florestal para a composição das áreas de reserva legal.

Cabe ressaltar que a obrigação de recuperação de determinada área dentro do imóvel rural depende da análise pelo órgão ambiental competente para o licenciamento, por meio do CAR – Cadastro Ambiental Rural, pré-requisito para a regularização ambiental, onde serão analisadas e validadas as informações declaradas, identificando-se a cobertura vegetal do imóvel rural, a delimitação das áreas de preservação e eventual necessidade de recuperação de áreas degradadas.

Diante dos cenários que o país vive em relação a temática, é imprescindível que as responsabilidades sejam devidamente separadas e conhecidas. A insegurança trazida pela inovação do Poder Judiciário pode implicar na violação de outros vários direitos e princípios constitucionais.

É importante frisar que a tutela ambiental civil tem como objetivo recuperar o meio ambiente degradado, caso tenha ocorrido dano ambiental. Entretanto, o descumprimento de norma administrativa não configura, por si só, dano ambiental presumido e o dever de repará-lo, mas sim infração administrativa sujeita a sanção correspondente e aplicável pelo órgão ambiental competente.

Assim, a comprovação da ocorrência de um dano ambiental e a diferenciação entre a responsabilidade administrativa e a responsabilidade civil é de suma importância para determinar se há o dever de indenização pelo proprietário rural, seja de ordem material ou moral, ainda que a conduta tenha se realizado sem a licença ambiental.

Por esse motivo, a decisão do Superior Tribunal de Justiça não pode ser reconhecida como um precedente geral e aplicada sem a devida análise caso a caso.

[1] https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=2302212&num_registro=202200653510&data=20230922&formato=PDF

[2] Prejuízos presumidos que independem de prova para justificar o arbitramento judicial de indenização.

 

Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-dez-27/decisao-do-stj-impacta-futuro-da-responsabilidade-civil-por-dano-ambiental/

Autor: Francine Gomes Pavezi • email: francine.pavezi@ernestoborges.com.br

A DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E O IMPACTO NAS FUTURAS DECISÕES A RESPEITO DA RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL

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