Entendimento foi adotado pela Seção Especial Cível no primeiro Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas sobre o tema julgado no país

 

O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS) decidiu que vale notificação por meio eletrônico (e-mail ou mensagem de texto por SMS e WhatsApp) sobre registro de consumidor em cadastro de inadimplentes, desde que comprovados o envio e o recebimento da comunicação. Não é necessária, porém, a confirmação de leitura.

 

O entendimento foi adotado pela Seção Especial Cível no primeiro Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) sobre o tema julgado no país. A decisão, portanto, unifica o entendimento do TJMS. Cerca de três mil processos foram paralisados (sobrestados) para aguardar o julgamento.

 

Os dez desembargadores que compõem a Seção Especial, por unanimidade, consideraram decisões recentes das turmas de direito privado (3ª e 4ª) do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a Súmula 404 da Corte, de 2014, que dispensa o aviso de recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados e cadastros.

 

O relator do IRDR é o desembargador Ary Raghiant Neto. Ele entendeu que “a notificação eletrônica é adequada para fomentar os fins da norma em exame [o Código de Defesa do Consumidor – CDC], necessária e proporcional em sentido estrito, pois promove o objetivo legal em sintonia com os valores da livre iniciativa e proteção ao meio ambiente, sem sacrifício indevido ao princípio da defesa do consumidor”.

 

O desembargador acrescenta, em seu voto, que “a integração do consumidor ao mundo digital não pode ser ignorada ou presumida abusiva no trânsito de direitos e deveres, obrigações e ônus das relações de consumo” (IRDR nº 0835488-67.2023.8.12. 0001/5000).

 

Ao Valor, Raghiant Neto acrescentou que esse tema “abre uma janela para reforçar o fato de que os meios eletrônicos fazem parte do dia a dia do cidadão e do Poder Judiciário”. Para ele, é preciso “contemplar as novas tecnologias na busca de um processo mais célere e eficaz”.

 

Segundo Daniel Feitosa Naruto, sócio do escritório Ernesto Borges Advogados, que representou a Boa Vista Serviços nesse IRDR, a discussão é relevante por atingir um número significativo de pessoas que buscam o Poder Judiciário para desconstituir a notificação do artigo 43, parágrafo 2º, do CDC, quando realizada de forma eletrônica e reivindicar reparação por supostos danos morais sofridos.

 

“O julgamento, mesmo que de forma regional, é um forte indicativo da tendência de adequação do Código de Defesa do Consumidor, datado de 1990, aos avanços tecnológicos”, afirma.

 

Para ele, a possibilidade de notificação por meios eletrônicos, em nenhum momento, representa deficiência na proteção do consumidor nem caracteriza ofensa à sua dignidade, não conflitando com a finalidade principal do CDC. “Pelo contrário, perfaz-se, unicamente, de adequação e atualização das normas consumeristas ao próprio ordenamento jurídico que há anos já conversa intimamente com os avanços tecnológicos.”

 

Ronaldo Kochen, do escritório Souto Correa Advogados, compartilha a opinião de que a notificação eletrônica é a mais adequada para comunicar aos consumidores a respeito da sua inscrição em cadastros de proteção de crédito. “Com o avanço do acesso tecnológico, essas soluções acabam se tornando mais eficazes e adequadas que as soluções tradicionais, como a de notificação por correspondência enviada ao endereço físico”, diz o advogado.

 

No entendimento do advogado, a decisão do TJMS é relevante, pois versa sobre os procedimentos que os mantenedores dos cadastros devem adotar para que a inscrição seja válida e não respondam por danos morais decorrentes de uma inscrição indevida. “Em sendo exigida a correspondência física, então a inscrição realizada com uma comunicação eletrônica seria inválida, ensejando danos morais.”

 

Apesar de o acórdão que julgou o IRDR ser bem fundamentado, afirma Kochen, é possível que a questão seja levada ao STJ, por meio de recurso. De acordo com ele, a matéria tem sido bastante discutida no tribunal superior.

 

O advogado lembra que a 3ª Turma do STJ vinha decidindo pelo envio de correspondência física para comunicar a inscrição do consumidor em cadastros restritivos de crédito. No ano de 2023, várias decisões foram unânimes nesse sentido. Em setembro deste ano, porém, com base em precedente da 4ª Turma, os ministros da 3ª Turma mudaram de entendimento.

 

Eles acompanharam, por maioria de votos, o posicionamento da validade da notificação eletrônica. No julgamento, a ministra Nancy Andrighi, que acabou vencida, pontuou que a decisão estaria alterando a jurisprudência da turma (REsp 2092539/RS).

 

A advogada do consumidor no caso julgado por IRDR foi procurada pelo Valor, mas não quis se manifestar sobre o assunto.

 

Disponível em: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/12/10/tjms-julga-irdr-e-valida-notificacao-eletronica.ghtml

Autor: Daniel Feitosa Naruto • email: daniel.naruto@ernestoborges.com.br

TJMS julga IRDR e valida notificação eletrônica

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