Imagem mostra uma mulher com alguns papéis na mão e fazendo conta em uma calculadora

O “imposto rosa” ou “taxa rosa”, apesar de receber este nome, não é precisamente um tributo em si, mas sim um fenômeno de sobrepreço para produtos “femininos”, quando em comparação com os mesmos produtos “masculinos”.

Muito além dos produtos mais consumidos no dia 8 de março (flores e chocolates), o imposto rosa afeta a vida diária das mulheres, que gastam cerca de 10% a mais nos produtos que lhe são destinados quando em comparação aos destinados a homens. A expressão “imposto rosa” foi cunhada em um estudo feito por um órgão consumerista da cidade de Nova York nos Estados Unidos, no ano de 2015. “Imposto” refere-se figurativamente ao preço maior que as mulheres têm de pagar por seus produtos, como se de fato o preço daqueles fosse calculado com a incidência de um tributo que não alcança os bens para o público masculino. A escolha de “Rosa” por sua vez, possui ligação direta com o fato que a maioria dos produtos destinados as consumidoras são vendidos na cor rosa: escovas de dente, desodorantes, lâminas de depilação e até mesmo sabonetes.

No Brasil, o estudo americano foi replicado em 2017 pelo grupo de Mestrado Profissional em Comportamento do Consumidor (MPCC) da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) na cidade de São Paulo. O grupo chegou à conclusão que os produtos “rosa” possuem um sobrepreço de 12,3% quando comparados aos produtos comuns. E a diferença de preços não se restringe a bens materiais, estando também presente em serviços: cortes de cabelo, depilação e até mesmo serviços de transporte exclusivamente femininos chegam a ser 27% mais caros.

É importante destacar que o fenômeno do Imposto Rosa não reside na obrigação das mulheres de pagar a mais pelos mesmos produtos e serviços, mas na observação de que produtos apresentados como desenvolvidos ou pensados para mulheres são mais caros do que aqueles desenvolvidos para homens. Ademais, o público feminino que desconhece esse sobrepreço é facilmente manipulável a comprar os produtos que se valem dessa prática. Quando um produto possui em seu rótulo “para homens”, tem-se a sensação automática de que aquela fórmula não será benéfica para as especificidades femininas – que são por vezes irreais, tendo em vista que o Imposto Rosa afeta bens universais, como pastas de dente.

Mas porque o Imposto Rosa existe? Segundo pesquisadoras da área o fenômeno se baseia em duas premissas básicas: o estereótipo que mulheres consomem mais do que homens, e que a venda de produtos especialmente para o público feminino traduz uma ideia de inclusão.

No primeiro argumento, deve-se refletir sobre como as mulheres são vistas como as mais consumistas, as que mais gastam com produtos para beleza e moda. Caso queira quer não, a premissa não deixa de ser verdadeira, afinal as mulheres (em regra) consomem muito mais produtos supérfluos que os homens. Mas a questão pede uma análise ainda mais profunda: o consumo “exagerado” de maquiagens e roupas reflete as dificuldades femininas em alcançar um padrão muito alto que não existe para os homens. Estar maquiada, bem vestida, especialmente nas últimas tendências do mundo da moda, com os cabelos cortados e a pela jovial – quase sempre devido a serviços estéticos – são alguns dos requisitos da mulher bem sucedida. O segundo ponto por sua vez também é verdadeiro. Em um mundo construído por homens para homens, a inclusão de produtos “femininos” pelas marcas alude ao ideal de uma participação igualitária no mercado. As mulheres se sentem bem em consumir produtos feitos especificamente para elas.

O fenômeno ainda está igualmente presente nos produtos destinados apenas a mulheres. Tem-se a título de exemplo a tributação (desta vez em seu sentido literal) de absorventes femininos. Segundo o Impostômetro, índice mantido pela Associação Comercial de São Paulo, no estado de São Paulo o absorvente no ano de 2020 tinha tributação média de 34,48%, cálculo que inclui PIS, COFINS e ICMS. Em comparação a outros bens, os absorventes, conforme o princípio da seletividade e para os fins de tributação do ICMS, são mais supérfluos que jóias, perfumes e cosméticos.

Enganam-se também os que pensam que o sobrepreço afeta apenas mulheres adultas. Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin) revelou que os pais que têm filhas têm gastos até 30% maiores do que pais que tem meninos. A diferença de gastos escancara outro problema que perpetua a assimetria de preço entre os produtos femininos e masculinos: o fato que meninas consomem e devem gostar mais de consumir que meninos.

A solução para o Imposto Rosa, contudo, é mais complexa do que aparenta. Isso porque além dos poucos estudos realizados na área, é difícil o estabelecer um parâmetro objetivo que verifique se um produto é de fato mais caro apenas por ser destinado a mulheres, ou se as mudanças na embalagem e em suas cores realmente despendem mais recursos em sua produção e pesquisa.

Assim sendo, o próprio posicionamento da consumidora é a maneira mais efetiva de esvaziar essa prática do sobrepreço. Em um país onde mulheres são pagas menos que seus colegas homens, e paralelamente pagam a mais em seus produtos, é necessário estar atenta a algumas práticas que podem beneficiar as finanças femininas: a comparação de preços, o raciocínio se a separação dos produtos por gênero trás algum benefício real, ou a simples compra de produtos “neutros” são alguns destes instrumentos.

 

*Flávia Sant’anna Benites, sócia do escritório Ernesto Borges Advogados, atua no âmbito contencioso e consultivo, abrangendo a elaboração de opiniões legais e pareceres, análises estratégicas (Regimes Especiais, Termo de Acordo), panoramas dos ativos e passivos tributários, restituição de indébito tributário, defesas nas autuações fiscais e demais questões tributárias. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito “Instituição Toledo de Ensino de Presidente Prudente – Estado de São Paulo”. Especialização em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Pós-graduada em Direito Público pela Escola de Direito do Ministério Público.

 

Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/344186/imposto-rosa-preco-de-ser-mulher

Autor: Flávia Sant'Anna Benites • email: flavia@ernestoborges.com.br • Tel.: +55 67 99984 1406

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